Apesar de sabermos pouco sobre a necessidade da dose de reforço da vacina para COVID-19, muitos governos têm apostado em revacinar a população.
Quais são as evidências científicas para isso? O que se sabe? E o não se sabe? Por que estamos revacinando sem ter evidências científicas para isso? Neste artigo abordaremos os principais elementos em discussão no Brasil e no mundo, e as evidências científicas mais importantes. Confira!
Por que é necessária uma dose de reforço da vacina para COVID?
Algumas razões que explicam a necessidade são:
a. Declínio da imunidade: Foi documentado que, após a vacinação completa, os níveis de anticorpos contra o coronavírus reduzem gradativamente ao longo dos meses. Portanto, aplicar uma dose de reforço confere um maior número de anticorpos e, em tese, uma maior proteção contra o vírus.
b. Diminuição da proteção para algumas variantes específicas, principalmente a Delta: a eficácia de produção de anticorpos é ligeiramente para a nova variante, apesar de que foi documentado que todas as vacinas para COVID são eficazes. Não há trabalhos que mostrem duração das vacinas além de 6 meses.
Discussão sobre anticorpos (neutralizadores) e proteção para vacinas
Sabe-se que os níveis de anticorpos neutralizadores estão intimamente relacionados à proteção do SARS-Cov-2 e que a sua queda pode sugerir susceptibilidade à doença. Porém, foi observado que, mesmo em populações em cujos anticorpos estavam baixos, ele tem uma tendência a ter infecções menos graves, com menor necessidade de internação e risco de morte que grupos não vacinados.
Essa evidência sugere que outras vias de imunidade tem um papel de proteção contra o vírus, como a resposta celular inata. Os mecanismos dessa via não estão profundamente estudados ainda.
Eu não tomei a dose de reforço. Estou protegido?
Sim, a vacina para COVID funciona muito bem, têm resultados animadores e diminuem drasticamente a chance das pessoas terem desfechos graves pelo SARS-Cov-2. Mesmo que os anticorpos declinem com o tempo, há evidências científicas que pessoas vacinadas têm chance drasticamente menor de manterem proteção a longo prazo quando comparadas a pessoas não vacinadas.
Eu preciso obedecer a mesma marca da vacina para COVID?
Só há evidência científica de receber reforço de vacinas das mesmas tecnologias e marcas. Não há evidências de que se houver troca de marcas há manutenção do benefício.
Quais vacinas precisam de reforço? O que sabe até o momento?
Até o momento, a Sinovac/CoronaVac® mostrou que, em população maior que 60 anos, uma dose de reforço confere aumento de anticorpos após 6-8 meses após as 2 doses administradas.
A empresa Janssen/Johnson & Johnson® anunciou que a sua vacina para COVID de uma única dose mantém os anticorpos por até 8-9 meses e que uma dose de reforço aos 6 meses aumenta significativamente os níveis de anticorpos3. A empresa se põe à disposição para discussão do governo para discussão dos dados preliminares.
A empresa Pfizer® anunciou que as duas doses iniciais produzem proteção para variante Delta e que uma dose de reforço entre 6 e 12 meses pode aumentar a chance de manter os anticorpos em níveis mais altos.
Para a vacina da Astrazeneca®, mostrou-se que quanto maior o intervalo entre a primeira e segunda dose, maior a produção de anticorpos. Isso inclui grupos em cujos intervalos eram de 5 e 10 meses. Além dessas duas, mostrou-se que uma dose adicional de reforço aumenta o número de anticorpos, mas não se sabe se isso é necessário².
O que os governos do Brasil e do mundo estão sugerindo, e porquê?
A organização responsável de cada governo deve mensurar a veracidade de informações técnicas e observar os níveis alarmantes da variante Delta se alastrando. A grande maioria dos governos está priorizando a finalização da vacinação de toda a população e revacinação de grupos específicos porque entende que é mais seguro e requer menos investimento revacinar do que pagar esperar a variante delta causar novas internações.
Dose de reforço e ética global
É antiético fornecer 3ª dose de uma vacina com baixa qualidade científica e permitir que outras pessoas ainda não tenham tido a oportunidade de finalizar a vacinação sabidamente protetora para COVID. Então, as disparidades do capitalismo acentuam as diferenças neste ponto.
Perguntas para o futuro:
1) O número de anticorpos neutralizadores é a única variável mensurável que confere imunização? Quais são essas outras variáveis e como medi-las?
2) Quanto tempo dura a proteção das vacinas? 6 meses? 12 meses? 2 anos?
3) Qual a proporção de casos de COVID grave dentro de pessoas com 2 doses de vacina? Este dado servirá de base para auxiliar na decisão de política de dose de reforço.
Bibliografia:
1. Interim statement on COVID-19 vaccine booster doses. World Heath Organization. 10 Agosto 2021, disponível em www.who.int
2. Flaxman A, et. al. Tolerability and Imunogenicity after a late second dose or a third dose of a ChAdOx1 nCoV-19 (AZD1222). Lancet: https://dx.doi.org/10.2139/ssrn.3873839
3. Sadoff G, et al. Durability of antibody responses elicited by a single dose of Ad26.COV2.S and substantial increase following late boosting. medRxiv 2021. Doi: 10.1101/2021.08.25.21262569
4. Hongxing P, et al. Immunogenicity and safety of 1 a third dose, and immune persistence of CoronaVac vaccine in healthy adults aged 18-59 years: interim results from a double-blind, randomized, placebo-controlled phase 2 clinical trial. medRxiv, Julho 2021, https://doi.org/10.1101/2021.07.23.21261026;